O futuro do Mais Médicos
Julizar Dantas
Mestre em Saúde Pública, Cardiologista, Médico do Trabalho (*)
Considerando-se a realidade da Saúde Pública no
Brasil, mais crítica nas pequenas cidades do interior, na periferia das regiões
metropolitanas e nas populações indígenas e quilombolas, a reestruturação do
Programa Mais Médicos requer debate e reflexão para alcançarmos mais saúde.
Não se questiona a participação de médicos de outros países no programa,
desde que seja respeitada a legislação brasileira. A Portaria interministerial MEC/MS nº
278, de 17 de março de 2011 exige que os médicos estrangeiros ou brasileiros formados no exterior,
sejam submetidos ao exame “Revalida”, realizado em parceria com Universidades
Federais, para aferir as competências necessárias para o exercício da Medicina
no Brasil. Estas exigências ocorrem em todos os países desenvolvidos e
civilizados. Por exemplo, o Reino Unido (General
Medical Council) exige a validação do diploma e avaliação da fluência
em Inglês.
Na Atenção Básica à saúde, o cerne da questão não está somente na escassez
de médicos. Destacam-se as precárias condições de infraestrutura, a
carência de recursos primários, incluindo a falta de medicamentos e materiais
para simples curativos, essenciais para o exercício digno da Medicina. Emerge
o risco à integridade física e emocional do médico, da equipe de saúde e dos
pacientes, desestimulando a fixação dos profissionais de saúde nas cidades
do interior.
A solução definitiva para melhoria da Atenção Básica à saúde inclui a
melhoria dos processos de gestão em Saúde Pública. Requer a reestruturação e
adequação do Programa Saúde da Família, Unidades Básicas de Saúde, Unidades
de Pronto Atendimento, equipadas com laboratórios de análises clínicas,
exames de imagens (Rx, Ultrassonografia, etc), entre outros recursos
necessários, além de hospitais regionais de referência aptos para atender a
demanda da população.
Há carência de recursos disponíveis para a formação de equipes
multiprofissionais do SUS, incluindo médicos, enfermeiros, técnicos de
enfermagem, agentes de saúde, odontólogos, farmacêuticos, bioquímicos,
fisioterapeutas, nutricionistas, fonoaudiólogos, psicólogos, entre outros
profissionais de saúde. Urge criar condições para acelerar o processo de
interiorização da Atenção Básica à saúde de boa qualidade, fornecendo a
infraestrutura e os recursos necessários para o bom atendimento da
população.
Desde a criação do Mais Médicos em
2013, formaram-se mais de 58.000 médicos no Brasil. O site do Conselho Federal
de Medicina (CFM), informa a existência de 458.626 inscritos em novembro de
2018, havendo má distribuição da
densidade de médicos, ocorrendo uma grande concentração de
profissionais nas regiões mais desenvolvidas, nas capitais e no litoral. No
Brasil, a razão de médicos por 1.000 habitantes é 2,1, sendo o Sudeste a região
com maior concentração (2,81) contra 1,41 no Nordeste e 1,16 no Norte.
Portanto, necessita-se de uma política de Saúde Pública que promova a
aceleração desse processo de interiorização dos profissionais de saúde e
da assistência à saúde de boa qualidade.
As alternativas para solucionar esses
gargalos são a garantia de acesso dos médicos e pacientes a insumos e
equipamentos de diagnóstico e terapia; o apoio de equipes multiprofissionais;
o acesso às redes de referência e contrarreferência (leitos, exames e outros
procedimentos) para encaminhamento de casos diagnosticados; a garantia aos
médicos participantes de monitoria (presencial e à distância) vinculada a
programas de extensão de escolas públicas de Medicina.
Torna-se essencial a implantação da carreira federal no SUS para
médicos e equipes de saúde com o estabelecimento de vínculo contratual
permanente para profissionais aprovados em concurso público.
Outra alternativa para o atendimento dessa população carente em
assistência à saúde é a contratação de profissionais de Saúde com vínculo
provisório para recém-formados pelas Universidades Federais, Estaduais e
programas subsidiados, PROUNI e FIES.
O Exército pode contribuir na assistência aos indígenas, quilombolas e
comunidades isoladas, com o emprego do contingente de médicos, farmacêuticos e
dentistas enquadrados na Lei de
Prestação do Serviço Militar. Em condições especiais de alistamento,
resultantes da obtenção de adiamento de incorporação, deverão prestar o serviço militar no ano seguinte ao da conclusão
do respectivo curso ou após a realização de programa de residência médica ou
pós-graduação.
O financiamento da Saúde é dever do Estado. Utilizar adequadamente os recursos
provenientes da excessiva carga tributária, royalty do petróleo e da intensificação do combate à corrupção é o
caminho indicado.
(*) Autor de Coração e fatores de risco
(Belo Horizonte: ed.própria, 1996) e Trabalho
& coração saudáveis (Belo Horizonte: Ergo, 2007). Nota: este artigo foi
publicado no jornal “Estado de Minas” na data de hoje.